Tudo é relativo. Design é relação.

quarta-feira, 27 de julho de 2022

Por Marcelus Viana | Fundador e VP de criação e design do Grupo Sal

A frase é do mestre Paul Rand, personagem fundamental na minha formação como designer e no desenvolvimento da ‘Cultura Salgada’ – o conjunto de valores, princípios e diretrizes que inspira e orienta a turma que vive trabalhando no Grupo Sal.

Diferentemente da época em que cursei a faculdade de Desenho Industrial, que dividia seus alunos entre os cursos de “PP” (projeto de produto) e “CV” (comunicação visual), hoje existe um entendimento muito mais interessante e amplo sobre o significado e o papel do design no mundo. O que já foi percebido como ferramenta artesanal, visual ou industrial, hoje é absorvido como uma metodologia capaz de transformar experiências, processos, organizações, cidades e até conflitos.

O design se infiltrou em diversas áreas e evoluiu. A cada ano que passa, surge ao lado de novos prenomes e sobrenomes: Concept Design, Ux Design, Environmental Design, Production Design, System Design, Design Thinking, Design Sprint, Design Law. Tem até design de sobrancelhas! E não tem nada de estranho não, redesenhar sobrancelhas também é design.

Mas a verdade é que esse potencial sempre foi intrínseco ao processo do design. A Bauhaus teve o mérito de organizar, sistematizar e divulgar boa parte desse processo. Bruno Munari, que afirmava que “um designer é um planejador”, também consolidou essa visão no livro Das coisas nascem as coisas.

M.C. Telão, 2013

A prática de “cuidar das relações” pode começar com um esboço rápido em uma mesa de bar e se transformar em uma trajetória longa e complexa que envolve pesquisa, negociação, reflexão, modelagem, interação, ajuste, redesenho, produção, impressão e distribuição. O bom design deve refletir, equilibrar e cuidar das relações: forma, função e conteúdo. É uma equação atemporal e universal.

Com tantas possibilidades, é sempre bom voltar à frase que resume e, ao mesmo tempo, amplia. As sínteses do Sr. Rand se mostram poderosas e reveladoras: “Tudo é relativo. Design é relação. Você deve pensar nos problemas e não no design. O design é o resultado do seu pensamento. As soluções estão sempre escondidas em algum lugar do problema – você já sabe, tem de procurá-las. O processo do design vai da complexidade à simplicidade.”

Paul Rand, 1991. Fotografia por Sally Andersen-Bruce

Confesso que só li o seu livro Design, Form, and Chaos (Yale University Press, 1993) em 2010. Mas foi a partir dessa leitura que a minha percepção se transformou e novos horizontes se abriraml. A jornada de conhecimento sobre a sua obra é uma experiência extremamente reveladora. Seus textos simples, diretos, carregados de humor e inteligência traduzem reflexões de quem passou uma vida pensando e praticando design com significado.

Tenho a convicção de que, se eu tivesse lido seus livros no início da carreira, não só a minha vida profissional teria tido uma base muito mais consistente e clara, como também a minha visão sobre o que é design e a sua relação com o mundo seria muito mais ampla e profunda. Compartilhar ao máximo a obra desse pensador crítico, bem-humorado e atemporal tornou-se uma missão pessoal.

Se o design vai ajudar a salvar o mundo, é difícil saber. Mas se a gente conseguir cuidar das relações, o design pode ser uma ferramenta para encontrar caminhos mais sustentáveis, práticos, inclusivos, lucrativos, simples, bonitos e divertidos para todos nós.

Que assim seja.

P.S. Leiam Paul Rand!

 

Bibliografia:

Conversas com Paul Rand. Organização Michael Koreger, apresentação Steven Heller. Cosac Naify, 2010.

Thoughts on Design. Paul Rand. Chronicle Books, 1947.

Design, Form, and Chaos. Paul Rand. Yale University Press, 1993.

From LAscaux to Brooklyn. Paul Rand. Yale University Press, 1996.

Paul Rand, a Designer’s Art. Princeton Architectural Press, 2016.

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